quinta-feira, 31 de maio de 2012

Mata Atlântica tem maior desmatamento em Minas e Bahia



Dados do Inpe mostram que só resta 7,9% da cobertura original do ecossistema

Marco Túlio Pires
Mata Atlântica
Mata Atlântica: apenas 7,9% da cobertura original está intacta (DEDOC)
Minas Gerais e Bahia foram os estados que mais desmataram a Mata Atlântica entre 2010 e 2011. Nesse período, o ecossistema perdeu, ao todo, 13.312 hectares, o equivalente a uma vez e meia a área da ilha de Manhanttan, em Nova York. Juntos, os dois estados que lideram o ranking foram responsáveis por 81% da devastação. Os dados foram divulgados nesta terça-feira pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pela Fundação SOS Mata Atlântica. A análise é publicada periodicamente desde 1990. 

Saiba mais

MATA ATLÂNTICA
A Mata Atlântica é o ecossistema mais ameaçado do Brasil. Nela, vive mais de 62% da população brasileira e estão localizados 58% dos municípios do país. As florestas atlânticas abrigam árvores que atingem de 20 a 30 metros de altura. Elas acompanhavam todo litoral brasileiro do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte. Por causa do desmatamento, resta apenas 7,9% da área original em fragmentos acima de 100 hectares, essenciais para a conservação da biodiversidade. Considerando todos os pequenos fragmentos de floresta natural acima de 3 hectares, o índice chega a 13,32%.
ATLAS DA MATA ATLÂNTICA
O Atlas dos Remanescentes Florestais e Ecossistemas Associados do Bioma Mata Atlântica é publicado desde 1990. Trata-se de uma parceria entre a Fundação SOS Mata Atlântica, uma organização não-governamental, e o Instituto de Pesquisas Espaciais, órgão ligado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. Desde a quinta edição, de 2005-2008, o atlas considera os limites da Mata Atlântica com base na lei nº 11.429, de 2006.
De acordo com Marcia Hirota, coordenadora do Atlas pela Fundação SOS Mata Atlântica, houve uma pequena queda no desmatamento total. Contudo, o recuo pode ser devido à dificuldade de medir o desmate em regiões cobertas por nuvens. O mau tempo resultou na avaliação apenas parcial da Bahia (57%), de Minas Gerais (58%) e do Espírito Santo (36%), além de vários estados da  Região Nordeste.
"O ritmo de desmatamento continua estável, o que é preocupante", avalia Marcia. Nos últimos 25 anos a Mata Atlântica perdeu 17.354 quilômetros quadrados, o equivalente a 84% da área do País de Gales. Isso quer dizer que resta apenas 7,9% da área original, se considerados os remanescentes florestais em fragmentos acima de 100 hectares, representativos para a conservação de biodiversidade.
Triângulo do desmatamento - Entre os municípios, dos cinco que mais desmataram, três são de Minas Gerais. Eles formam o que os analistas chamaram de 'Triângulo do Desmatamento', e estão localizados na região nordeste do estado. São eles: Águas Vermelhas, a campeã do desmatamento (1.367 hectares); Jequitinhonha (1.270 hectares), que ficou em terceiro lugar — atrás de Canavieiras, na Bahia (1.337 hectares) —; e Ponto dos Volantes, com 539 hectares, que ficou em quinto, atrás da cidade baiana de Belmonte (902 hectares). Nessa região já foram identificados vários desflorestamentos entre 2008 e 2010. De acordo com a fundação, as florestas nativas estão sendo transformadas em carvão e substituídas por eucalipto. "O alerta fica principalmente para Minas, o estado que mais perdeu em termos de floresta", diz Marcia.
Desmatamento na Mata Atlântica - Arte VEJA
Apesar da situação preocupante dos dois primeiros colocados, alguns estados registraram quedas acentuadas nas taxas de desmatamento. O destaque é a região Sul. Entre 2008 e 2010, 8.813 hectares foram desmatados. Entre 2010 e 2011, foram 750 hectares.
O Rio de Janeiro, que já liderou a lista dos maiores devastadores em análises anteriores, agora está entre os que mais preservam. "O estado tem feito um excelente trabalho com a criação de Unidades de Conservação e com a participação da sociedade", diz Marcia.
De acordo com Mario Montovani, diretor de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica, o maior inimigo da Mata Atlântica é a expansão imobiliária. "No geral, a ocupação, o loteamento e a construção de imóveis é o maior problema atualmente", diz. 


segunda-feira, 21 de maio de 2012

Ruralista quer veto integral ao Código Florestal


01/05/2012 - Mario Coelho/Congresso em Foco
Deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP). Foto: Agência Câmara
Um dos maiores exportadores de suco de laranja do país, o deputado Nelson Marquezelli faz coro com os ambientalistas ao defender que Dilma derrube na integralidade o projeto aprovado pelo Congresso 


A bancada ambientalista ganhou um inesperado aliado na pressão para fazer a presidenta Dilma Rousseff vetar o Código Florestal, aprovado na última quarta-feira (25) pelo Congresso. O texto foi aprovado com amplo apoio dos integrantes da Frente Parlamentar do Agronegócio (FPA) e provocou protestos de petistas, parlamentares ambientalistas e organizações não governamentais ligadas à preservação do meio ambiente. O aliado inesperado é o deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP). Um dos maiores exportadores de suco de laranja do país, integrante da bancada ruralista na Câmara, o petebista disse ao Congresso em Foco que se estivesse no lugar da presidenta Dilma Rousseff “vetava o texto inteiro”.

“Se ela entender bem, vai vetar o Código inteiro. E vai chegar carregada na Rio +  20”, disparou Marquezelli. Para ele, Dilma deveria chamar especialistas em agricultura e em meio ambiente e, posteriormente, editar uma medida provisória ou uma portaria regulamentando a questão. Mas os motivos para o petebista pedir o veto são diferentes dos ambientalistas.

Punição e vantagem
 
Marquezelli questiona, por exemplo, a possibilidade de os produtores serem penalizados por terem desmatado antes da reforma do Código Florestal. Ele também critica duramente o papel dado ao Ministério Público. Para ele, os “promotores não conhecem o Brasil”. “O promotor vai propor a desapropriação da terra e prisão do produtor por não cumprir a lei. Ele não quer saber se produtor está produzindo ou não mil litros de leite por dia ou dez litros”, afirmou.
 
A posição de Marquezelli é minoritária dentro da FPA. A bancada ruralista, de acordo com o deputado Moreira Mendes (PSD-RO), está satisfeita com o texto. Para os integrantes da frente, ele dá segurança jurídica aos produtores. O petebista discorda. Disse preferir as portarias do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O motivo é simples: não há punição criminal para quem desmatar e descumprir a legislação ambiental.
 
Franco, Marquezelli faz uma outra avaliação sobre o Código aprovado. Como exportador de suco de laranja, entende que as novas regras são boas para os médios e grandes produtores, exatamente como argumentam os ambientalistas. Com menor área de plantio, o preço das commodities vai subir. No caso do petebista, a laranja.
 
“O preço está baixo. Se eu tirar 1,8 milhão de pés de laranja [pela necessidade de reflorestamento prevista no Código], vai faltar laranja e subir o preço. Então eu não posso falar que estou sendo prejudicado. Eu estou sendo favorecido. Quem está sendo prejudicado é o país porque vai ter uma quantidade menor de suco para exportar, tanto industrial, quanto produtor vai ganhar mais”, afirmou.


Código Florestal: cientistas vão continuar se manifestando contra aprovação dos deputados


O coordenador do GT da SBPC sobre o tema deu palestra na Reunião Regional onde apresentou um histórico da preservação dos recursos naturais.
  

Por Clarissa Vasconcellos - Jornal da Ciência
Textos e artigos divulgados na imprensa serão alguns dos recursos que os cientistas utilizarão para chamar a atenção da sociedade em relação a seu posicionamento contra a aprovação do texto do novo Código Florestal pela Câmara dos Deputados, na última semana. "Estamos publicando textos nos jornais e esperamos juntá-los para talvez fazer um documento e encaminhar à presidente Dilma", afirma José Antônio Aleixo da Silva, professor associado do Departamento de Ciência Florestal da Universidade Federal Rural de Pernambuco e coordenador do Grupo de Trabalho da SBPC que estuda o Código Florestal.
Aleixo apresentou no último sábado (28) a palestra "Código Florestal: agronegócio e/ou sustentabilidade ambiental?", durante a Reunião Regional da SBPC, que aconteceu em Oriximiná (PA). "O que aconteceu na terça-feira [24 de abril] foi um tremendo retrocesso para o País. Da mesma forma que também seria um retrocesso se tivesse sido aprovado o que os ambientalistas queriam", opina, acrescentando que a posição do GT e de boa parte dos cientistas brasileiros é que se encontre um meio-termo, com ambas as partes "cedendo um pouco". "Falta fundamento científico [nos argumentos], tanto do lado do agronegócio quanto do ambiental", completa.
Ilustrativa e didática, a palestra de Aleixo fez um percurso na história da defesa dos recursos naturais do País, citando Duarte Coelho, que em 1537 já se preocupava com a devastação efetuada no Brasil colonial; José Vieira Couto (crítico da "bárbara agricultura" já em 1799) e José Bonifácio de Andrade, que em 1823 acreditava que em dois séculos o País se transformaria em um "deserto árido como o da Líbia".
Histórico - O professor lembrou que desde o primeiro código florestal, de 1934, cientistas e pesquisadores participaram de sua elaboração. Mas lamentou que, nos dias de hoje, apesar de os cientistas terem sido ouvidos pelos políticos, suas observações não foram consideradas. Algumas das sugestões dizem respeito, por exemplo, às Áreas de Preservação Permanente (APPs) nas margens de cursos d´água, que, na opinião do GT, deveriam ser integralmente restauradas e demarcadas a partir do nível mais alto do rio, e não de um nível regular como foi aprovado.
Os participantes do grupo de trabalho também enfatizam que as comunidades tradicionais, agricultores familiares e ribeirinhos devem ter um tratamento diferenciado e que não deve haver uma generalização para todos os produtores agrícolas. Algumas dessas observações foram relembradas na nota de repúdio que o GT publicou após a aprovação dos deputados (http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=82157).
Durante a palestra, Aleixo mostrou dados que lembram que, em pesquisa recente, se comprovou que 65% dos 851 milhões de hectares do Brasil são compostos por terras agricultáveis e que quase 40% estão ocupados com essa atividade. A grande maioria delas (44%) são pastagens "muito mal ocupadas". "Estamos sendo muito ineficientes fazendo pastagens. Hoje temos em média um animal por hectare. Se passássemos a dois animais por hectare, liberaríamos metade dessas terras para ocupação agrícola, por isso não tem sustentação pedir mais áreas", afirma.
Código da Biodiversidade - Ele também recordou a ideia do geógrafo Aziz Ab'Saber, falecido este ano, de substituir o Código Florestal por um Código Ambiental ou de Biodiversidade, que englobaria não só o âmbito florestal, mas também o pesqueiro, climático, mineral, urbano, industrial, entre outros. "Não se pode pensar no setor florestal de maneira separada", pontua.
Além disso, Aleixo destacou a importância do controle da ocupação urbana, citando exemplos como a desastre que se abateu sobre a Região Serrana fluminense no início de 2011, a maior tragédia natural do País.

Fonte: Jornal da Ciência/EcoAgênciaecoagencia

Senador Anibal Diniz diz que texto do Código Florestal traz insegurança jurídica


Anibal Diniz diz que texto do Código Florestal traz insegurança jurídica
Redação do DIARIODEPERNAMBUCO.COM.BR 
30/04/2012 | 18h58 | Meio Ambiente



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O senador Anibal Diniz (PT-AC) disse em Plenário nesta segunda-feira (30) que as alterações aprovadas pela Câmara dos Deputados ao projeto de novo Código Florestal – aprovado pelo Senado Federal no ano passado, após grande acordo entre o governo e os produtores rurais – colocaram o Congresso Nacional em uma “situação constrangedora”. O parlamentar disse que o texto aprovado gera muita insegurança jurídica e que a presidente Dilma Rousseff deverá vetá-lo, total ou parcialmente, como já pediram os relatores da matéria no Senado, os senadores Jorge Viana (PT-AC) e Luiz Henrique (PMDB-SC).

O representante acreano citou estudo elaborado pelo advogado André Lima, membro da Comissão Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil e consultor jurídico da Fundação SOS Mata Atlântica. O estudo, de acordo com o senador, mostra “os prejuízos mais gritantes” do projeto aprovado na Câmara dos Deputados.

Entre esses prejuízos, relata a retirada do primeiro artigo do projeto aprovado pelo Senado Federal, que define uma série de princípios que caracterizam o Código Florestal como uma lei ambiental. De acordo com o autor do estudo, essa retirada reforça a tese de que o Congresso Nacional transformou o Código Florestal em “uma lei de consolidação de atividades agropecuárias ilegais, ou uma lei de anistia àqueles que praticaram irregularidades”.

Dia do Trabalho

No mesmo pronunciamento, o parlamentar comemorou o Dia do Trabalho, citando a criação de 440 mil novos postos de trabalho com carteira assinada no Brasil no primeiro trimestre deste ano. O aumento da oferta de emprego, acrescentou, decorre da política de valorização do trabalho empreendida no Brasil desde o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ele também destacou as campanhas de valorização do salário mínimo desenvolvidas nos últimos anos pelas centrais sindicais e parabenizou o novo ministro do trabalho, o deputado federal Brizola Neto, que, aos 33 anos, passa a ser o ministro mais novo do gabinete da presidente Dilma Rousseff.

O parlamentar ainda anunciou a inauguração, pelo ministro do Desenvolvimento, da Zona de Processamento de Exportação de seu estado, no próximo dia 21. Anibal Diniz teve seu pronunciamento parabenizado, em aparte, pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS).

Da Agência Senado

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Nova lei deve impedir recuperação ambiental de regiões mais devastadas e sensíveis a desastres


Se não for vetada pela presidenta Dilma Rousseff, a proposta de revogação do Código Florestal aprovada pela Câmara, no dia 25/4, condenará muitas regiões brasileiras que hoje sofrem com o desmatamento excessivo a conviver com suas consequências para sempre.
A falta de cobertura vegetal torna esses locais mais vulneráveis a desastres climáticos e desabastecimento de água. Por isso, muitos já vêm sendo alvo de programas de recuperação de APPs (Áreas de Preservação Permanente).
O texto aprovado pelos deputados, no entanto, pode impedir essas iniciativas ao regularizar em massa atividades agropecuárias em margens de rio, encostas, topos de morro e outras áreas sensíveis consideradas APPs. Isso comprometerá os serviços ambientais prestados por elas: fornecimento e filtragem da água, polinização, controle de pragas, redução e mitigação da erosão, do assoreamento, de enchentes e deslizamentos (leia mais abaixo).
Pelo projeto aprovado pela Câmara, APPs desmatadas ilegalmente até julho de 2008 praticamente não precisarão ser reflorestadas. A proposta obriga a recomposição de só 15 metros da vegetação desmatada às margens de rios com até 10 metros. Em rios mais largos, dispensa a recuperação dos desmates realizados até julho de 2008.
A lei atual obriga a recuperação de margens de rio desmatadas numa faixa que varia de 30 a 500 metros.

Plantação de bananas no município de Sete Barras, no sul de São Paulo. Nova lei deverá regularizar atividades agropecuárias em áreas vulneráveis que precisam ser recuperadas
























Mais de 90% das propriedades rurais serão dispensadas de restaurar a RL (Reserva Legal) desmatada: apenas as maiores de quatro módulos fiscais terão de fazê-lo, desde que o proprietário não alegue que a área já estava desmatada quando não era exigida sua proteção pela lei vigente à época (saiba mais).
Assim, as regiões mais devastadas do país praticamente não terão recuperação obrigatória, dependendo apenas de atitudes voluntárias dos proprietários.
Situação crítica
A maior parte do passivo ambiental do País está no centro-sul e Nordeste, onde está a grande maioria das 38 bacias hidrográficas que, segundo o Probio (Programa de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica) do MMA (Ministério do Meio Ambiente), têm menos de 20% de cobertura vegetal nativa (veja mapa abaixo). O índice é menor do que o de grande parte dos países da Europa e se aproxima ao do Haiti.
Trabalhos como o do pesquisador Jean Paul Metzger, da USP (Universidade de São Paulo), sugerem que uma área rural precisa de, no mínimo, 30% de vegetação nativa. Abaixo desse limite, os serviços prestados pelos ecossistemas estariam prejudicados.
Bacias por onde passa o Rio Tietê (SP) tem menos de 10% de vegetação, por exemplo. A Bacia do Aguapeí-Peixe, no mesmo estado, tem 3,5%.




Nessas regiões, as APPs são ainda mais necessárias, mas estão em situação crítica. Mais da metade delas está desmatada em Alagoas, Pernambuco, Sergipe, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Paraná.
Foi retirado do texto aprovado pelos deputados o dispositivo que, ao autorizar a recuperação de APPs em índices superiores ao definido na lei, poderia salvaguardar bacias com níveis críticos de desmatamento.
Impactos irreversíveis
Nas últimas semanas, aumentou a mobilização pelo veto de Dilma. A expectativa é que ela reponha a proposta aprovada pelo Senado, em dezembro, que obrigava a recomposição de 15 metros a 100 metros na beira de cursos de água.
Os relatores da reforma do Código Florestal no Senado, Luiz Enrique (PMDB-SC) e Jorge Viana (PT-AC), apresentaram um projeto de lei com esse objetivo (veja o documento).
Com a nova proposta, ainda assim deve ser incorporado à produção agropecuária quase 42% do passivo estimado de 55 milhões de hectares de APPs desmatadas no País, segundo o pesquisador Gerd Sparovek, também da USP. Assim, poderá deixar de ser reflorestado um território do tamanho de Roraima.
O Código Florestal diz que as APPs têm a “função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”.
Quando a lei foi editada, em 1965, as pesquisas sobre essas áreas ainda engatinhavam. Mas a situação mudou nos últimos anos.
“Em longo prazo, reduzir o tamanho de APPs na sua largura e extensão ou na exclusão de áreas frágeis hoje protegidas gera impactos ambientais irreversíveis”, aponta o livro “O Código Florestal e a Ciência – contribuições para o diálogo”, da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e da ABC (Academia Brasileira de Ciências).

APPs prestam serviços fundamentais, como a contenção da erosão e do assoreamento
























“As larguras vigentes hoje para as APPs foram estabelecidas, digamos, de forma arbitrária no Código de 1965, mas em todos os trabalhos científicos que fizemos sobre erosão do solo e o papel da mata ciliar como corredor ecológico essa largura de 30 metros têm se mostrado como a largura mínima”, destaca Ricardo Rodrigues, professor da USP e um dos autores da publicação.
Para ele, a necessidade de manter as atuais dimensões das áreas protegidas nas beiras de rio já é um consenso científico.
A queda na capacidade de armazenamento de água e na vazão dos rios é um impacto que a redução das APPs pode trazer, segundo os cientistas. Daí o risco de legalizar desmatamentos em regiões já devastadas.
“[As APPs] são fundamentais para manter a produtividade em sistemas agropecuários, tendo em vista sua influência direta na produção e conservação da água, da biodiversidade, do solo”, destaca o documento da SBPC e da ABC.
De acordo com o livro, estimam-se em cerca de R$ 9,3 bilhões anuais as perdas provocadas pela erosão em áreas agrícolas, prejuízo que poderia ser evitado com a proteção e recuperação das matas ciliares.
O trabalho da SBPC e da ABC destaca a importância das APPs de beira de rio como abrigo e fonte de alimento para a fauna responsável pela polinização e controle de pragas. A publicação indica que, em 107 culturas importantes para a alimentação humana, 91 dependem em algum grau de polinizadores naturais. Das culturas com maiores volumes de produção, 35% dependem diretamente desse serviço.
Apesar de sua importância, estimativas indicam que, pela lei vigente, nas margens de corpos de água, as APPs significariam apenas 7% da extensão propriedades.
Enchentes e deslizamentos
De novembro de 2009 a janeiro de 2012, 1.665 pessoas morreram e mais de 1,1 milhão ficaram desalojadas ou desabrigadas por causa de enchentes e deslizamentos em todo País, de acordo com a SNDC (Secretaria Nacional de Defesa Civil).
De 2006 a 2011, o governo federal gastou R$ 6,3 bilhões com “desastres naturais”, principalmente inundações, deslizamentos e erosão, aponta levantamento da CNM (Confederação Nacional dos Municípios).


Rastro de destruição deixado pela enchente em Teresópolis, região serrana do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011





















O prejuízo, no entanto, pode chegar às dezenas de bilhões de reais porque a maior parte dos recursos gastos com esses desastres não vem da União, mas dos governos estaduais e municipais, para os quais não há informações disponíveis.
Dados do governo e dos cientistas comprovam que parte significativa desses eventos está ligada ao desmatamento, degradação e ocupação irregular das APPs. A tendência é que a importância dessas áreas na mitigação e prevenção aos desastres aumente com o agravamento das mudanças climáticas.
“A redução das APPs vai dar o aval para que milhares de pessoas permaneçam dentro das áreas de risco. É legalizar o risco. Estão apostando em uma nova tragédia”, afirmou o geógrafo Marcos Reis Rosa, na análise “Congresso Brasileiro vai anistiar redução de florestas em pleno século 21?”, do WWF.
Rosa foi um dos pesquisadores indicados pelo MMA para avaliar as causas da maior tragédia climática do País, em que morreram quase mil pessoas, em janeiro de 2011, na região serrana do Rio de Janeiro. O levantamento comprovou relação direta entre a ocupação das APPs e o desastre.
“O presente estudo demonstra que se a faixa de 30 metros em cada margem (60 metros no total) considerada Área de Preservação Permanente ao longo dos cursos d´água estivesse livre para a passagem da água, bem como, se as áreas com elevada inclinação e os topos de morros, montes, montanhas e serras estivessem livres da ocupação e intervenções inadequadas, como determina o Código Florestal, os efeitos da chuva teriam sido significativamente menores”, aponta o documento.
Segundo a pesquisa, 92% dos deslizamentos ocorreram em áreas com algum tipo de alteração (construções, agricultura, estradas). Deste total, até 70% estavam em APPs.



Levantamento do governo comprovou que, se Código Florestal tivesse sido respeitado, tragédia teria sido menor. Na imagem, linha tracejada da APP que deveria ter sido respeitada em Teresópolis




















Os técnicos descobriram que, mesmo em áreas florestadas, quando houve deslizamento, ele pode ter sido influenciado por algum tipo de alteração, como a construção de estradas e desmatamentos na base ou no topo dos morros.
Por causa de tragédias como essa, na tramitação do novo Código Florestal no Senado, pesquisadores sugeriram que a lei tivesse um capítulo específico para zonas urbanas. O texto aprovado pela Câmara, no entanto, não traz nenhuma inovação que aponte para a reversão da situação atual de descontrole das ocupações irregulares das APPs. Ao contrário, legaliza pastagens em encostas e topos de morro, tornando-os ainda mais vulneráveis a deslizamentos.

Proteção de APPs pode modernizar pecuária? 


O pesquisador Gerd Sparovek acha que a proteção APPs pode incentivar a modernização da pouco produtiva pecuária brasileira. Dados do IBGE indicam que as fazendas no País tem uma lotação média de menos de uma cabeça por hectare, considerada muito baixa.

Sparovek aposta que o cercamento das APPs, com a retirada do gado dessas áreas e a implantação de bebedouros canalizados fora delas, forçará os pecuaristas a criar mais animais em espaços menores. Isso poderia ser viabilizado com tecnologias como a rotação de pastagens, que permite ampliar a eficiência das propriedades com o uso programado e o descanso de áreas previamente subdividas.

“Qualquer conduta mais razoável do ponto de vista ambiental fará com que a pecuária de corte extensiva do Brasil tenha que se modernizar. Mais moderna, ela se torna mais produtiva, e assim ocupa menor área para a mesma produção”, conclui o especialista.
O especialista aponta que 80% dos 55 milhões de hectares do passivo em APPs são ocupados por pastagens. Ele avalia que grande parte das APPs na Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica pode ser regenerada pelo simples isolamento, sem a necessidade de plantio de florestas.

De acordo com a ideia de Sparovek, reduzir as APPs implicaria um benefício ambiental menor – por causa da área menor em floresta – para os mesmos gastos financeiros (cercamento, retirada do gado), sem ganhos em produtividade. Ao passo que manter as APPs segundo os parâmetros do atual Código Florestal representaria um grande benefício ambiental com ganhos proporcionais em produtividade da propriedade.

Retirada do gado das APPs, com instalação de bebedouros, poderia estimular modernização da pecuária, segundo Sparovek




























ISA, Oswaldo Braga de Souza.

Fonte: ISA